Fumante passivo consome até dez cigarros por dia
Dez cigarros por dia. A marca pode não assustar os fumantes mais vorazes, mas surpreende qualquer pessoa quando se sabe que ela pertence justamente a quem não colocou nenhum cigarro na boca. Essa é a quantidade de fumo que pode ser absorvida por um garçom que trabalhe durante todo o dia cercado por clientes fumantes, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca).
Os males causados pelo cigarro aos que decidiram não fumar, mas que são obrigados a conviver com quem fez essa opção, foram alguns dos principais motivos que levaram o Ministério da Saúde a tornar mais dura a campanha contra o tabagismo e a enviar, até o fim deste mês, um projeto de lei ao Congresso Nacional. O objetivo: proibir a existência dos fumódromos – ambientes fechados criados exclusivamente para uso dos fumantes.
A prática já havia sido proibida em ambientes públicos fechados, como escolas e ônibus, mas os redutos para fumantes em restaurantes, escritórios e boates, até então, eram preservados pela legislação. O governo não quer que sejam mais.
Tendência
“É um movimento internacional. Além disso, o Brasil é signatário de um tratado em que vários países se comprometem a combater o tabagismo. A ciência também já constatou que essas salas fechadas nunca vão isolar 100% os efeitos da fumaça do cigarro sobre quem não fuma”, justificou o técnico do Programa Nacional de Controle de Tabagismo do Inca, Felipe Mendes.
Ele explicou ainda que a proibição também deve atingir boates e outros estabelecimentos de entretenimento que tenham esses espaços.
Sobre bares e restaurantes que determinam a área de fumantes e de não-fumantes com o uso de áreas semi-abertas, como varandas, Mendes disse que cada caso será avaliado separadamente pelas vigilâncias sanitárias municipais, que vão fiscalizar a aplicação da lei.
Desde 2005, de acordo com o Inca, as vigilâncias recebem orientações para agir contra o tabagismo na esfera privada. “Começamos a treiná-las nesse sentido. Vamos ter uma série de ganhos, além da melhora da qualidade de vida dos funcionários desses locais”, afirmou.
Sindicato teme que comerciante seja prejudicado
O combate ao tabagismo não deve passar por cima dos direitos de quem fuma, na opinião do presidente do Sindicato dos Restaurantes, Bares e Similares do Estado, Wilson Calil. “Acho que se tem de preservar o direito de quem fuma e de quem não fuma. Ou então se deve tornar o fumo uma droga ilícita”, completou. Ele defende que a lei não restrinja, por exemplo, os ambientes que tenham locais fechados e abertos. “As varandas não podem ser consideradas ambientes fechados.
Espero que os donos de estabelecimentos possam atender a fumantes e não-fumantes e que até que se possa criar um estabelecimento exclusivo para quem fuma”, afirmou. O sindicato teme que a nova norma prejudique mais os proprietários de bares e restaurantes já afetados pela lei que proibiu a venda de bebidas alcoólicas às margens das rodovias.
Perigos do fumo
Conheça as conseqüências do vício em quem consome cigarro, seja de livre e espontânea vontade, seja por convívio com fumantes em família ou no trabalho
Os riscos
Por que quem não fuma sofre até mais que o fumante
com os prejuízos do cigarro
Fonte de nicotina
A fumaça que sai da ponta do cigarro contém o triplo de nicotina e monóxido de carbono e até 50 vezes mais substâncias cancerígenas do que a fumaça que entra pela boca do fumante
Conseqüências
Fumantes passivos têm um risco 23% maior de desenvolver doença cardiovascular e 30% mais chances de ter câncer de pulmão
Efeitos tardios
Eles também têm 24% a mais de chances sofrer um infarto e maior risco de desenvolver doenças como a arterosclerose
Efeito cascata
Cigarros também afetam família de quem fuma
Esposas
Uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo (USP) mostrou que a esposa não-fumante de marido fumante tem 25% mais chances de ter um acidente coronário do que a esposa de um não-fumante. O índice de ter câncer do pulmão é 26% maior
Filhos
O risco de ter um ataque de asma aumenta 14% quando a pessoa tem pai fumante. Se a mãe também consumir cigarros, o risco aumenta para 38%. No caso de ambos os pais serem tabagistas, o percentual aumenta ainda mais, chegando a 48%
O projeto
Proposta que o governo federal enviará ao Congresso
O que muda. O texto altera a Lei 9.294, de 1996, que determina regras para a publicidade de cigarros e bebidas alcoólicas. A principal modificação se dá no artigo que permite a existência de locais fechados para uso exclusivo dos fumantes
Inversão . O novo texto proíbe a existência desses locais fechados, os chamados fumódromos, sob a alegação que não minimizam os males causados pelo cigarro para os fumantes e não-fumantes
Bares e restaurantes . Os casos de bares e restaurantes que possuem ambientes fechados e abertos para atender os dois públicos serão avaliados caso a caso, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca)
Boates. Serão atingidos pela nova lei e não deverão permitir que se fume
Fiscalização. A aplicação das regras ficará a cargo das vigilâncias sanitárias municipais, como já acontece com a proibição de se fumar em locais públicos fechados como escolas, por exemplo
Data. O projeto de lei deve ser encaminhado ao Congresso Nacional até o fim deste mês
Fonte: Instituto Nacional de Câncer (Inca)
Alguns componentes
1 Nicotina
Uma das principais substâncias presentes no cigarro, a nicotina é capaz de causar dependência
2 Alcatrão
Material articulado composto por substâncias como arsênico, níquel, benzopireno, que podem provocar câncer
3 Monóxido de carbono
Mesma substância que sai do cano de descarga dos veículos
4 Metais
Como o cádmio e o cromo, esses metais pesados são encontrados em baterias de veículos
5 Agrotóxico
Como os utilizados no cultivo das folhas de tabaco, a exemplo do DDT
6 Acetona
Normalmente usada como removedor de esmalte
7 Formol
Fluído conservante, muito usada em cadáveres
Números
250 mil pessoas
Esse é o saldo de mortes associadas ao consumo do cigarro, registradas a cada ano, no Brasil, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca).
61% viciados
Essa é a porcentagem de pessoas que assumiram ser viciadas em fumo, durante pesquisa feita pelo Instituto Futura no final de 2007.
4.720 substâncias
Esse é o número aproximado de componentes tóxicos já isolados na fumaça do cigarro. Muitas delas são cancerígenas.
Médico: “Esse vício é uma das piores epidemias”
Um mal que começa cedo, mas com efeitos que só começam a ser percebidos décadas mais tarde. Esse é um dos motivos que fazem com que o fumante só busque tratamento quando atinge os 40 anos de idade, aproximadamente. Esse fator, associado à cultura que se criou em torno do fumo, fazem do tabagismo uma das piores epidemias que existem, segundo o pneumologista Marcos Santos.
“Existem dados que apontam que 200 mil brasileiros vão morrer em decorrência de doenças causadas pelo cigarro. O que mata mais que isso?”, questiona o médico, que considera um avanço as medidas adotadas pelo governo para tentar minimizar os efeitos do tabagismo.
“Cigarro é a única droga vendida do primeiro para o terceiro mundo. E o país só perde, porque o lucro vai todo embora. Mesmo assim, acho que já avançamos. O percentual de fumantes no país caiu de 35% para cerca de 20%”, completou.
Para Santos, a preocupação do governo com os efeitos do cigarro sobre o fumante passivo são pertinentes. “Depois de fumar um cigarro, o fumante ainda exala a nicotina que consumiu durante cerca de 30 minutos. Além disso, antes se pensava que era só não fumar perto, mas já se sabe que a nicotina é absorvida pela pele.”
Pare de fumar
Disque Pare de Fumar:
Abrangência: nacional
Tel.: 0800-7037033
Programa de Combate ao Tabagismo:
Abrangência: estadual
Tel.: 3137-2473
Longe da fumaça
“Hoje, me sinto mais saudável”
Lulu Pretti Ex-promoter
Durante, pelo menos, seis horas por dia, durante nove anos, vivi em ambientes fechados e repletos de fumaça das boates. A pior parte era chegar à minha casa fedendo a cigarro. Não havia como usar uma roupa duas vezes. Era chegar e colocar direto para lavar. Hoje, em que trabalho no ramo imobiliário, me sinto mais saudável. Parece que o ar é outro. Vivo em um ambiente melhor. A mudança causou uma grande reviravolta. Pelo menos nunca tive crises alérgicas por causa da fumaça do cigarro. Mas conheço muita gente que deixa de ir a ambientes que permitem fumantes, porque não suportam e passam mal.”
Lei deve estar aliada à fiscalização e à educação
Fiscalização intensa e ações educativas que possam fazer com que mais e mais pessoas se convençam da necessidade de parar de fumar. Esses dois fatores devem andar junto das mudanças na legislação proposta pelo governo na opinião da coordenadora estadual do Programa de Combate ao Tabagismo, Cremilda Maria de Mello Silva.
“É preciso mudar a lei, mas também tem que haver um trabalho educativo e fiscalização. É preciso saber como será a punição para quem não cumprir”, disse a coordenadora, que é favorável à decisão do governo.
Ela também apóia o aumento de impostos sobre o cigarro, citado como outra medida a ser adotada pelo governo federal. “Estudos mostram que há redução no consumo quando o preço aumenta”, salientou.
´´Ainda há uma tolerância grande com o cigarro. É preciso proteger o fumante passivo. Essa é uma medida de saúde pública”
Cremilda Maria de Mello Silva . coordenadora estadual do Programa de Combate ao Tabagismo
Siderúrgica faz ação, e índice de fumantes cai de 24% para 2,5%
Anny Giacomin
Em 1992, a ArcelorMittal Tubarão, então CST, decidiu realizar uma pesquisa para descobrir quais os fatores que colocavam em risco a saúde dos empregados. Não deu outra: o cigarro foi apontado como um dos principais pontos. Das pessoas que trabalhavam na companhia naquele ano, 24% eram fumantes.
Para tentar amenizar os efeitos maléficos causados pelo cigarro, foi criado um programa antitabagismo. Segundo o gerente de Medicina do Trabalho da ArcelorMittal Tubarão, Fernando Ronchi, os funcionários e seus dependentes passaram a contar com suporte médico e psicológico.
Além disso, não é permitido fumar em ambientes fechados. “Temos na empresa 34 pontos específicos, em locais abertos, em que as pessoas podem fumar”, diz.
O programa tem dado resultado. Ronchi comemora o fato de que, hoje, apenas 2,5% dos empregados são fumantes. “E nossa meta é, até o final de 2009, não ter mais fumantes na empresa. Não é uma proibição, é questão de educação e conscientização”, explica o gerente de Medicina do Trabalho da empresa.
Autor: Elisangela Bello
OBID Fonte: A Gazeta – ES