Cracolândia mantém ´feirão de droga` a céu aberto 4 meses após ação policial
Joel Silva
Leandro Machado
Giba Bergamim Jr.
Folha – UOL – São Paulo
Três mesas acomodam de maneira organizada pratos de cerâmica cheios de pedras de coloração bege. Ao lado, celulares, maços de dinheiro, balanças e pequenos vidros. Diante das mesas, três homens separam o material que será vendido a dependentes químicos eufóricos atrás de drogas: crack e lança-perfume.
O comércio ilegal a céu aberto ocorre quatro meses após uma operação da Polícia Civil, sob responsabilidade da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), que prendeu o que chamou de eixo criminoso que abastecia a feira das drogas.
Nessa área, funciona um projeto prioritário para a gestão Fernando Haddad (PT), o Braços Abertos –que oferece moradia e trabalho remunerado em troca da adesão a um tratamento de redução do uso de drogas. A administração petista acusa a polícia de ser ausente no local.
O vaivém de traficantes e usuários dentro da feira foi registrado pela Folha nesta segunda (5). A negociação ocorre sob barracas instaladas na rua Dino Bueno, epicentro da cracolândia, próximo à Sala São Paulo, a 1,6 km do prédio do comando da PM e a 1,3 km do Denarc (departamento de narcóticos da Polícia Civil).
Ali, diariamente agentes da prefeitura fazem uma operação de limpeza da área. No momento em que caminhões com jatos de água passam, usuários e traficantes desmontam as barracas e aguardam o fim da operação. Depois que a área é lavada, tudo retorna ao mesmo lugar. Tráfico e uso de drogas voltam a ocorrer normalmente.
LINHA DE MONTAGEM
A venda de drogas na cracolândia ocorre num processo semelhante ao de uma linha de montagem. Nas imagens registradas pela reportagem é possível ver pedras picadas e prontas para o consumo. Cada uma costuma ser vendida livremente por R$ 5.
Antes de chegar às mesas, elas saem de estabelecimentos comerciais da região em forma de tabletes.
Passam às mãos de traficantes que atravessam o fluxo de viciados até chegar às barracas. Ali, com estiletes ou facas, outros vendedores cortam os tabletes em pequenas pedras. Também há pequenos vidros que, segundo dependentes, é lança-perfume.
Ao lado dessas barracas há uma espécie de oficina de confecção de cachimbos. Os utensílios para uso da pedra são feitos com ferro e canudos semelhantes a antenas de rádio para carros. Também são vendidos ali por cerca de R$ 5.
A prefeitura diz que a guarda municipal tem atuado para defender os agentes que trabalham na tentativa de atrair novos dependentes para o programa Braços Abertos.
“As polícias Militar e Civil, responsáveis pelo combate ao tráfico de drogas, seguem ausentes da região há mais de 20 anos. E, pelo visto, continuarão assim”, afirma o texto.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública diz que Haddad já fez elogios ao trabalho da polícia na cracolândia. Afirma que o Denarc investiga a ação de grandes fornecedores de drogas na área.
Neste ano, diz, foram presas 69 pessoas envolvidas com o tráfico e ao menos 110 mil pedras de crack foram apreendidas. Segundo a pasta, o policiamento é ininterrupto com seis bases fixas e policiais com motocicletas.
Na sexta (2), uma operação do Denarc prendeu um traficante peruano que guardava 65 kg de cocaína num depósito na região da Luz.
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AÇÕES NA CRACOLÂNDIA
Jan.2012
PMs fazem operações nas ruas e desocupam imóveis abandonados que eram usados por usuários, usando bombas de gás. Dependentes que se concentravam na rua Helvétia se dispersam para outras ruas
15.jan.2014
Assistentes sociais e funcionários de limpeza da prefeitura retiram usuários e limpam a rua. Segundo a prefeitura, após a ação, 300 pessoas foram cadastradas no programa De Braços Abertos
29.abr.2015
Uma operação desarticulada entre prefeitura e governo estadual transforma o centro em praça de guerra, com bombas de gás, barricadas, furtos a pedestres e depredação de ônibus. Dois dias depois, fluxo retorna à quadra ao lado
5.ago.2016
Sem conhecimento da prefeitura, as polícias civil e militar realizam uma grande operação com cerca de 500 homens. A Tropa de Choque dispersa usuários com jatos d´água, balas de borracha e bombas de gás, e policiais civis arrombam hotéis da região e prendem 32 suspeitos de tráfico
Fonte:UNIAD – Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas